Osmar Gomes dos Santos
Juiz de Direito da Comarca da Ilha de São Luís; Membro das Academias Ludovicense de Letras; Maranhense de Letras Jurídicas e Matinhense de Ciências, Artes e Letras.
No semanário de notícias uma em especial me chamou a atenção: a fuga de brasileiros milionários do país. Açodadamente conclui que poderia ser um modismo, mas inquietei-me em debruçar sobre o tema em questão. Por que tantas pessoas estariam deixando para trás toda uma vida para aventurar-se em terras distantes em um contexto mundial instável? Atrativos lá, ou desilusão cá?
Ao cabo de minha análise, percebo que o brasileiro está perdendo a fé nos rumos da nação e, quem pode, está deixando para trás uma dura realidade em busca de uma vida melhor. Após todas as alternativas possíveis, parece que aquela dita ser “a última que morre” teve seu funeral. Esperança, apesar de ser muito falada, é palavra que já não se acredita por cá na parte de baixo dos trópicos.
O “sou brasileiro, não desisto nunca”, campanha lançada pela Associação Brasileira de Anunciantes – ABA, tinha como objetivo retomar a autoestima dos nacionais, fazendo-os acreditar, abraçar e assumir seu papel no processo de reconstrução da nação. A tentativa valeu, mas, para muitos, o fogo vivo naquele brado de euforia arrefeceu e a hora de desistir parece ser a única verdade diante de uma cruel realidade de desencanto com a Terra de Vera Cruz.
O otimismo deu lugar ao medo, à incerteza e à insegurança. Assistimos sistematicamente a fuga de brasileiros para outros países cujas condições sociais, políticas e econômicas são mais atrativas e estáveis. Dados da New World Wealth, empresa de pesquisa que rastreia o movimento da riqueza no mundo, revelou que continuamos entre os 10 países com fuga de cidadãos com posses de 1 milhão de dólares ou mais. Nos últimos três anos foram 17 mil brasileiros nessa condição.
E lá se vão nossos compatriotas, espalhando-se pelo mundo, aventurando-se além-mar, em terras muitas vezes desconhecidas. Se fôssemos somar aqui a evasão de mão-de-obra, incluindo a qualificada, estaríamos falando de números bem superiores, a exemplo da fuga de cérebros, que colocam sua expertise a serviço de outras nações devido à falta de apoio e oportunidade por aqui.
Mas em falando dos milionários “brasucas”, para os quais não invoco o sentido pejorativo, Portugal, dos nossos irmãos portugas, tem sido o destino mais buscado. O país reúne boas condições para que os brasileiros possam prosperar, além do fato de que o idioma facilita a adaptação. Portugal e Estados Unidos somaram investimentos de 3,2 bilhões de dólares “verde e amarelo” em 2017, um recorde.
Quando são analisados dados mais completos, nos quais não se leva em consideração a posse de valores, pelo menos 69 mil brasileiros declararam saída definitiva do país desde 2014, segundo a Receita Federal. O número só cresce e em 2017 foram quase 22 mil declarações, podendo ser bem maior, uma vez que não se contabiliza a emigração ilegal.
Retomo minha reflexão inicial para concluir que o alto índice de corrupção atrelado à má gestão dos recursos públicos gerou grande instabilidade política, acarretando consequências negativas em diversas áreas sociais. A falta de perspectivas para problemas como economia estagnada, saúde, educação, lazer, desemprego e, mais fortemente e segurança tem impulsionado e acelerado a “fuga” daqueles que muito ainda poderiam contribuir com a nação.
O quadro de baixa autoestima diante da crise de insegurança – no qual a deterioração do aparelho de segurança pública, aliada à incapacidade das autoridades em lidar com um tema essencial no cotidiano dos cidadãos – mexe com o que cada um tem de mais essencial: a vida. E quem não busca preservar aquilo que tem de maior valor?
Sob um prisma diferente a canção “Bye, bye, Brasil” – de Chico Buarque e Roberto Menescal, que também embalou filme de mesmo título no fim da década de 1970 – retratava mudanças pelas quais a nação passava. Influências estrangeiras no processo de modernização criavam uma interessante dicotomia com a realidade de diversas regiões, retratadas por meio de telefone público, o já praticamente extinto “orelhão”.
A letra da música, assim como o enredo gravado na película, fazia críticas à perda de identidade, principalmente na cultura – frente à influencia estrangeira, notadamente norte-americana. De conotativa a realidade hoje não tem nada, uma vez que repousa sobre uma triste e real constatação de que esta terra, para muitos, já não é o que se pode chamar de lar. O autoexílio voltou a deixar de ser uma alternativa para se tornar questão de preservação da vida, como ocorrera em tempos sombrios de nossa história.
A última ficha, dita na canção como referência à ficha do orelhão, hoje é substituída pelo sentido figurado que algo fora entendido. Ou seja, para milhões de brasileiros, muito além dos milhares que já levantaram voo, a ficha caiu. Essa desesperança tem profundos e negativos impactos para a nação, motivo pelo qual não se pode assistir a tudo isso sem uma ação de resgate das condições mínimas para que a repatriação aconteça.
O Brasil vive um momento ímpar em sua história, no qual precisa retomar seu caminho, concretizar um novo pacto federativo capaz de resgatar a credibilidade das instituições e que possa resultar em melhores condições de vida para a população. Na economia, urge a retomada da credibilidade, criação de condições para a cadeia produtiva, geração de empregos e a possibilidade de acesso a bens de consumo.
Por fim, é preciso que na esfera social, especialmente na segurança pública, o país, que parece estar em um descompassado galope, retome as rédeas do seu desenvolvimento. Embora o cenário não parece favorável, devo afirmar que não há melhor momento para iniciarmos uma nova caminhada, fundada em valores outrora renegados, rumo a um futuro de mais oportunidade para todos. Sem essa de bye, bye, o Brasil é dos brasileiros!