Fernando Araújo da Cruz Junior foi considerado culpado por homicídio, coação e fraude processual.
Fernando Araújo da Cruz Junior, 34 anos, delegado da Polícia Civil de Mato Grosso do Sul há sete anos – afastado do cargo há mais de dois anos por estar preso – a partir de hoje é um homem condenado por crime hediondo.
Em júri nesta tarde, o conselho de sentença o considerou culpado pelo assassinato do boliviano Alfredo Rengel, de 48 anos, ocorrido no dia 23 de fevereiro de 2019, dentro de ambulância a caminho de hospital de Corumbá, na rodovia ligando a cidade brasileira a Puerto Quijarro, no país vizinho.
Diante da decisão dos sete jurados, cinco mulheres e dois homens, o juiz André Monteiro, da 1ª Vara Criminal de Corumbá, aplicou a pena total de 20 anos e 10 meses de reclusão e ainda seis meses de detenção.
Os crimes imputados ao delegado são homicídio doloso duplamente qualificado, por motivo torpe e recurso que dificultou a defesa da vítima, coação a testemunha e fraude processual.
Foi aplicada a norma do concurso material de crimes, quando a pessoa agride a lei penal mais de uma vez ao mesmo tempo, aumentando o tempo de prisão.
Como Fernando está preso preventivamente há 2 anos e 2 meses, esse interstício será descontado do tempo na cadeia. Ele está em cela da 3ª Delegacia de Polícia Civil, no Bairro Carandá Bosque, onde policiais civis ficam até o julgamento por crimes.
Como foi – O júri disse sim para às perguntas sobre a culpabilidade de Fernando para um fato que teve início na Bolívia e terminou, de forma fatal, no caminho para o Brasil.
“Estava escoltado esperando a ambulância passar. Intercepta, desce, não dá chance nenhuma, pá, pá, pá, pá”, afirmou o representante do Ministério Público Rodrigo Amaro, ao descrever a atuação criminosa atribuída ao delegado.
Conforme a apuração feita pela Corregedoria da Polícia Civil, Fernando esfaqueou Alfredo, conhecido como “Ganso”, em evento na Bolívia, e como ele não morreu, foi atrás da ambulância para concretizar o homicídio, a tiros.
Foram quase 12 horas de júri, iniciado às 7h30 e encerrado por volta das 19. O réu ficou em Campo Grande, onde está preso, e o “tribunal do júri” foi instalado no Fórum de Corumbá.
Durante a sessão, o veículo usado por Fernando para cometer o assassinato, segundo a investigação policial e a denúncia da promotoria, foi motivo de intensos debates.
O advogado Irajá Pereira Messias sustentou falta de comprovação de se tratava da camionete S-10 de Fernando, como consta dos autos.
Tentou argumentar, em vários momentos, que o carro de camionete cabine dupla, o que não é caso do carro do cliente.
A promotoria, por sua vez, defendeu que além de haver provas, por meio de vídeo do momento, foram descobertas ações do investigado, com ajuda de colegas de polícia, um deles também réu no processo, para coagir testemunhas e embaraçar as investigações.
Por exemplo, segundo detalhado, foram feitas mudanças nas características da camionete de Fernando, para alteras aquelas apontadas pela perícia. O veículo nunca foi apresentado, sob pretexto de ter sido “penhorado” pelo réu.
O policial Emannuel Contis, que chegou a ser preso junto com Fernando, no dia 29 de março de 2019, em operação da DEH (Delegacia Especializada de Repressão aos Crimes de Homicídio) e do Garras (Delegacia Especializada de Repressão a Roubo a Banco, Assaltos e Sequestros), também foi julgado hoje.
Foram listadas como indícios dos crimes as conversas rastreadas em celulares, principalmente tendo Contis como interlocutor.
Em parte delas, o delegado discute com o outro policial sobre como enganar a apuração da Corregedoria da Polícia Civil.
Quente – O júri foi tenso.
Teve acusação do advogado de que que colegas fizeram armação para “roubar a felicidade” de Fernando. Teve, ainda, a expulsão do plenário da esposa do delegado, Silva Aguilera Benitez, depois de ela interromper a fala do promotor em duas ocasiões.
Silvia deixou o plenário proferindo ofensas à Justiça brasileira, para ela responsável por “mentiras” contra a Bolívia, principalmente em razão da não aceitação durante o processo de anexação de papelada do país vizinho pela defesa.
Diante disso, ela não acompanhou a leitura da sentença pelo magistrado. O pai, a irmã e a mãe de Fernando ficaram no plenário. Quando foi lida a decisão, a mãe protestou.
“Ele não matou ninguém”, afirmou, em tom bastante nervoso.
Aos jurados e aos promotores, alegou que estavam destruindo a vida do filho dela.
Cabe recurso ainda, por se tratar de sentença de primeiro grau.
O advogado Irajá Pereira Messias, ao fim do juri, disse que a decisão será tomada em conjunto com o acusado.
Reclamou, porém, de cerceamento da defesa, sem detalhar, e citou a possibilidade de mudar o resultado em tribunais superiores.